A luta em defesa da liberdade<br>e da democracia
O derrube do regime fascista – ditadura terrorista dos monopólios (associados ao imperialismo) e dos latifundiários – fez-se exactamente como o PCP preconizara e defendera: pela via do levantamento nacional, no caso concreto, o levantamento militar do Movimento das Forças Armadas (MFA), imediatamente seguido de um levantamento popular.
Trava-se uma intensa luta de classes que se traduz nas apreciações e nas medidas que propõem os vários sectores sociais e os partidos que os representam com o PS, PPD e CDS a porem em causa o curso da democratização do País
Levantamento militar e popular a que se seguiu um extraordinário fluxo revolucionário que derrubou o fascismo e instaurou as liberdades e a democracia.
Povo e o MFA aliados numa mesma aspiração e num mesmo combate e, num curto período de tempo, conseguiram grandes transformações democráticas que, desde o início, contaram com a acção contra-revolucionária das forças de direita e saudosistas do passado, e que teve expressão em diversas tentativas de liquidar a democracia e as liberdades conquistadas: actos de sabotagem económica e financeira, boicotes, tentativas de subversão do programa do MFA e golpes reaccionários.
Acção reaccionária em que se inclui também o vasto conjunto de acções violentas levadas a cabo pela rede terrorista/bombista que, em particular no Verão de 1975, deixou um rasto de destruição, que acompanhou a acção desestabilizadora de forças políticas apostadas em interromper e reverter a marcha revolucionária e as suas extraordinárias transformações políticas, económicas, sociais e culturais.
Transformações que se aprofundaram e alargaram à esfera económica e financeira com a nacionalização dos sectores fundamentais da nossa economia, a seguir à derrota do golpe reaccionário do 11 de Março, conduzindo à efectiva liquidação do capitalismo monopolista de Estado em Portugal.
Mas foi esse mesmo o caminho seguido pela reacção que, à medida que a Revolução assumia este rumo antimonopolista, tentou tudo, incluindo o terrorismo bombista e outras formas de violência, de pressão e de chantagem, para alterar em seu proveito a correlação de forças e o rumo dos acontecimentos.
À medida que se iam aprofundando as transformações revolucionárias na economia com a liquidação dos monopólios e dos latifúndios com maior intensidade a partir das eleições para a Assembleia Constituinte (25 de Abril de 1975), usando o processo eleitoral contra a dinâmica revolucionária, as forças reaccionárias com uma intensa intervenção da direcção do PS, que, a partir de agora passa a assumir abertamente uma atitude direitista, anti-comunista e anti-MFA ou de forças de pseudo-esquerda ultra-revolucionária e aventuristas desenvolvem uma nova fase na sua acção desestabilizadora visando romper a unidade entre o movimento popular e as forças armadas e, por esta via, destruir o verdadeiro motor da revolução e o sentido das transformações em curso.
Trava-se uma intensa luta de classes que se traduz nas apreciações e nas medidas que propõem os vários sectores sociais e os partidos que os representam com o PS, PPD e CDS a porem em causa o curso da democratização do País. Do outro lado, com a classe operária, com os trabalhadores e o povo, dinamizando a luta de massas, o PCP batia-se pela defesa da democracia, por uma política de unidade com as forças democráticas e progressistas, pela unidade entre Povo e Forças Armadas.
A complexidade da situação então vivida levou, inclusivamente, o PCP a propor, em Agosto de 1975, uma saída política para a crise que, no fundamental defendia: «que seja considerada por todos os interessados a imediata realização de um encontro entre as delegações das principais forças e sectores, que podem e devem procurar em comum uma solução para a crise, designadamente: a) Representantes oficiais das instâncias do poder militar e civil (Presidência da República, Governo Provisório e Conselho da Revolução); b) Representantes das principais tendências existentes no MFA – esquerda militar, oficiais do COPCON e grupo dos 9; c) Representantes de partidos políticos: Partido Comunista Português, outros partidos e organizações participantes no projecto de criação de uma ampla frente revolucionária, Partido Socialista». (in Documentos Políticos do Comité Central do PCP, Edições Avante!, Vol. III, Lisboa, 1976, p. 111)
Consciente das suas responsabilidades, o PCP fez, de facto, o possível e o impossível para assegurar a unidade com todos os democratas e particularmente com os socialistas.
Outra foi, no entanto, a opção da direcção do PS que preferiu alinhar com os partidos da direita, abandonando, juntamente com o PPD, o IV Governo Provisório, desencadeando uma vasta ofensiva contra Vasco Gonçalves e contra o V Governo Provisório, ao mesmo tempo que era desencadeada uma poderosa ofensiva terrorista contra o PCP e os sindicatos.
O Verão de 1975 e o papel desestabilizador
do terrorismo bombista
Nesta intensa luta de classes, a reacção recorreu também ao terrorismo bombista, com particular intensidade no Verão quente de 1975, com a participação, apoios e incitamentos de militares e de políticos constituiu um importante instrumento do avanço do processo contra-revolucionário – como reconhece Álvaro Cunhal (Álvaro Cunhal, A Verdade e a Mentira na Revolução de Abril (A contra-revolução confessa-se), Edições Avante!, Lisboa, 1999, p. 189) – e contou com a actuação de três organizações com ligações entre si e diversas conexões e cumplicidades, nacionais e internacionais: o MDLP, ELP e o Movimento Maria da Fonte.
«Em Julho têm lugar 86 actos terroristas, dos quais 33 assaltos, pilhagens e incêndios de Centros de Trabalho do PCP, 23 tentativas repelidas pelos militantes e lançamento de bombas, fogos postos e agressões. Em Agosto, no auge da ofensiva contra o V Governo, o terrorismo atinge também o seu máximo com 153 acções, das quais 82 assaltos e destruições de Centros de Trabalho (55 do PCP e 25 do MDP/CDE), 39 incêndios, 15 bombas, 23 agressões. Os partidos visados pelo terrorismo são os mesmos que são visados pela acção política do PS, PPD e CDS». (A Revolução Portuguesa o Passado e o Futuro, Edições Avante!, Lisboa, 1994, p. 203). Acção terrorista que, no mês de Agosto, é ainda acompanhada de outras acções de desestabilização como foram, no plano militar, a «desagregação e paralisação das estruturas superiores do MFA: desaparecimento prático do Conselho da Revolução e do Directório, liquidação da 5.ª Divisão, demissão de Vasco Gonçalves e, finalmente, já em Setembro, a Assembleia de Tancos» (id, ib, p. 199).
A acção do PCP na defesa
da liberdade e da democracia
A 14 de Agosto de 1975, no comício do PCP no Pavilhão dos Desportos, Álvaro Cunhal afirmava:
«Quando dizemos que a contra-revolução passou ao ataque, temos tendência para considerar somente os actos de violência , as pilhagens, os assaltos, os incêndios, as agressões, os atentados levados a cabo por comandos fascistas que se movem de terra para terra e por bandos fascistas locais constituídos por reconhecidos fascistas, ex-pides, ex-legionários, ex-ANP, e toda uma escumalha desclassificada.
«Na verdade estes ataques violentos da contra-revolução não se podem considerar isoladamente. Têm de ser compreendidos no quadro mais amplo da grave crise que o processo revolucionário atravessa e na ampla frente de forças que se movimentam contra a revolução.
«A violência contra-revolucionária é também inseparável da deterioração da situação militar, devida às dificuldades internas do MFA e ao crescente entendimento e movimentação de forças conservadoras que hoje levantam cabeça, procurando submergir o MFA e conspirando contra a nossa jovem democracia.
«A luta contra a vaga de violência fascista é uma das frentes essenciais no momento presente, porque, precisamente na situação da crise que atravessamos, a não se estancar essa ofensiva contra-revolucionária, ela pode desenvolver-se a pontos de pôr em perigo a curto prazo a própria existência das liberdades, abrindo caminho a um golpe de força da reacção e à instauração de uma nova ditadura terrorista.» (Álvaro Cunhal Obras Escolhidas, Edições Avante!, Lisboa, 2014, p. 622)
E no seu discurso no Comício do PCP, no Campo Pequeno, a 16 de Setembro, referia:
«Dezenas de Centros de Trabalho do Partido, fruto do sacrifício e do amor dos militantes, foram saqueados e incendiados pela fúria de bandoleiros contra-revolucionários. Os comunistas, educados na firmeza e combatividade pelo seu Partido, deram grandes exemplos, resistindo aos assaltos, correndo em socorro dos seus camaradas, prosseguindo actividades revolucionárias nas mais difíceis condições, chamando as massas à luta, organizando a resposta política em grandiosos comícios e manifestações.
«Sofremos ataques e perdas no Norte, nos Açores, na Madeira. Curaremos as feridas, reconstruiremos os Centros de Trabalho, sairemos da prova mais temperados e mais fortes e estamos certos de que os trabalhadores dessas regiões saberão finalmente reconhecer nos comunistas os seus mais dedicados defensores, porque, como nenhuns outros, são capazes de sofrer e de morrer pela libertação das classes trabalhadoras.
«Aqui está hoje de novo o PCP a afirmar a sua vitalidade revolucionária, o seu ardor militante, a sua capacidade de responder às mais complexas situações». (Álvaro Cunhal Obras Escolhidas, Edições Avante!, Lisboa, 2014, p. 651)
Uma luta que continua
Assim foi, de facto, como a história viria a mostrar. O PCP reconstruiu as suas sedes, reforçou a sua organização, ganhou prestígio político e influência social. Fiel à sua identidade, continuou a desenvolver uma intensa actividade em defesa dos interesses da classe operária, dos trabalhadores, do povo e do País. Activou a luta de massas em defesa da liberdade e da democracia, das conquistas da Revolução. Acção determinante para evitar que as forças de direita, apesar da violenta ofensiva desencadeada, conseguissem paralisar o processo revolucionário então ainda em curso e destruir as conquistas revolucionárias alcançadas.
Conseguindo interromper e inverter o rumo da Revolução Portuguesa, a partir de Julho de 1976 (tomada de posse do I Governo Constitucional do PS/Mário Soares), PS, PSD e CDS vêm prosseguindo, ao longo dos últimos 39 anos (em que se incluem 30 anos de integração capitalista europeia), uma política de direita de reconfiguração do Estado e reconstituição dos monopólios.
Uma enorme torrente de lutas, ao longo destes anos, em que participaram e participam os trabalhadores, com as suas organizações unitárias (em que se destaca o movimento sindical unitário consubstanciado na CGTP-IN) e o movimento popular ergueram uma heróica resistência ao processo de recuperação capitalista, agrária e imperialista dos partidos da política de direita em defesa de importantes conquistas da Revolução, da Constituição da República Portuguesa e pela projecção dos valores de Abril no futuro de Portugal.
Contra essa política de exploração, empobrecimento e submissão à UE, o PCP, os trabalhadores e o povo continuam a bater-se pela ruptura com esta política, por uma alternativa patriótica e de esquerda, indissociável da luta por uma democracia avançada vinculada aos valores de Abril, pelo socialismo e o comunismo.
Uma luta de ontem, de hoje e de sempre.